O ESTUDO SOBRE A
NATUREZA DO CRISTO VIII
VIII — O VERBO SE FEZ CARNE
“No
princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. — Ele
estava no princípio com Deus. — Todas as coisas foram feitas por ele e nada do
que foi feito o foi sem ele. - Nele estava a vida e a vida era a luz dos
homens. - E a luz brilhou nas trevas e as trevas não a compreenderam.
“Houve um homem enviado de Deus, que se chamava João. - Ele veio para servir de testemunha, para dar
testemunho da luz, a fim de que todos cressem por ele. — Ele não era a luz, mas
veio para dar testemunho daquele que era a luz.
“Aquele era a verdadeira luz que ilumina todo homem que vem a
este mundo, e o mundo foi feito por ele, e o mundo não o conheceu. — Ele veio à
sua casa e os seus não o receberam. - Mas, ele deu a todos que o receberam o
poder de se tornarem filhos de Deus, àqueles que crêem no seu nome, os quais
não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas
de Deus mesmo.
“E o Verbo foi feito carne e habitou entre nós e vimos a sua glória,
qual a que o Filho único havia de receber do Pai; e ele, digo, habitou entre
nós, cheio de graça e de verdade.” (S. João, 1:1 a 14.)
Esta passagem dos Evangelhos é a única que, à primeira vista,
parece encerrar implicitamente uma idéia de identificação entre Deus e a pessoa
de Jesus; é também a que serviu de base, mais tarde, à controvérsia a tal
respeito.
A questão da divindade de Jesus surgiu gradativamente; nasceu
das discussões levantadas a propósito das interpretações que alguns deram às
palavras Verbo e Filho. Só no quarto século uma parte da Igreja a
adotou, em princípio. Semelhante dogma resultou, pois, de decisão dos homens e
não de uma revelação divina.
É de notar-se, antes de tudo, que as palavras acima citadas são
de João e não de Jesus e que, ainda quando se admita que não tenham sido
alteradas, elas não exprimem, na realidade, mais que uma opinião pessoal, uma
indução, em que se depara com o misticismo habitual da sua linguagem; não
poderiam, pois, prevalecer contra as reiteradas afirmações do próprio Jesus.
Mesmo, porém, aceitando-as tais quais são, elas não resolvem de
modo algum a questão no sentido da divindade, porquanto se aplicariam
igualmente a Jesus, criatura de Deus.
Com efeito, o Verbo é Deus, porque é a palavra de Deus.
Tendo recebido diretamente de Deus a palavra, com a missão de a
revelar aos homens, ele a assimilou. A palavra divina, de que se penetrara,
encarnou nele; ele a trouxe consigo ao nascer e assim é que João pôde com razão
dizer: O Verbo foi feito carne e habitou entre nós. Jesus podia, pois,
ter sido encarregado de transmitir a palavra de Deus, sem ser o próprio Deus,
como um embaixador transmite as palavras do seu soberano, sem ser o soberano.
Segundo o dogma da divindade, é Deus quem fala; na outra hipótese, ele fala
pela boca do seu enviado, o que nada tira à autoridade das suas palavras.
Mas, quem autoriza esta suposição, de preferência a outra? A
única autoridade competente para decidir a questão é a das próprias palavras de
Jesus, quando diz: “Não tenho falado por mim mesmo; aquele que me enviou foi
quem me prescreveu, por seu mandamento, o que tenho de dizer. — A doutrina que
prego não é minha, mas daquele que me enviou; a palavra que tendes ouvido não é
palavra minha, mas de meu Pai que me enviou.” A ninguém fora possível
exprimir-se com mais clareza e precisão.
A qualidade de Messias ou enviado, que lhe é
atribuída em todo o curso dos Evangelhos, implica uma posição subordinada com
relação àquele que ordena; o que obedece não pode ser igual ao que manda. João
caracteriza esta posição secundária e, por conseguinte, estabelece a dualidade
de entidades, quando diz: E vimos a sua glória, tal como o Filho único devia
recebê-la do Pai, visto que aquele que recebe não pode ser o que dá e
aquele que dá a glória não pode ser o igual daquele que a recebe. Se Jesus é Deus,
possui a glória por si mesmo e não a espera de ninguém; se Deus e Jesus são um
único ser sob dois nomes diferentes, entre eles não poderia existir supremacia,
nem subordinação. Ora, não havendo paridade absoluta de posições, segue-se que
são dois seres distintos.
A qualificação de Messias divino não exprime que haja mais
igualdade entre o mandatário e o mandante, do que a de enviado real entre
um rei e seu representante.
Jesus era um messias divino pelo duplo motivo de que de Deus é
que tinha a sua missão e de que suas perfeições o punham em relação direta com
Deus.
ALLAN
KARDEC.
Fonte: O Livro “OBRAS PÓSTUMAS”, - Allan Kardec –27 a.
Edição. –Instituto de Difusão Espírita , - Araras, SP. – Maio 2012.
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