EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO.
CAPÍTULO
V.
BEM-AVENTURADOS OS AFLITOS.
A
VERDADEIRA INFELICIDADE.
Delphine
de Girardin - Paris. 1861.
24. Todos falam da infelicidade, já a sentiram
alguma vez e acreditam conhecer seus vários aspectos. Eu venho vos dizer que
quase todas as pessoas se enganam e que a verdadeira não é aquilo que os
homens, ou seja, os infelizes, supõem. Eles a vêem na miséria, na lareira sem
fogo, no credor exigente, no berço vazio do anjo que sorria, na lágrimas, no
caixão que se acompanha com a fronte descoberta e o coração partido, na
angústia da traição, na miséria do orgulhoso que gostaria de se vestir de ouro
e que esconde com dificuldade sua nudez nos farrapos da vaidade. Tudo isso e
ainda muitas outras coisas dá-se o nome de infelicidade na linguagem humana.
Sim, é a infelicidade para aqueles que vêem o presente; mas a verdadeira
infelicidade está mais nas conseqüências de um fato do que ele próprio. Dizei-me
se o acontecimento mais ditoso por um momento, mas seguido de conseqüências
funestas, não será realmente maior infelicidade do que o que cause a princípio
uma forte contrariedade, as acabe por produzir o bem. Dizei-me se a tempestade
que parte as árvores, mas saneia a atmosfera, dissipando os miasmas insalubres
que pudessem causar a morte, não será antes uma felicidade que uma
infelicidade.
Para
julgar as coisas é mister ver-lhe as consequências; assim é que, para apreciar
o que benéfico ou maléfico para o homem, preciso é que nos transportemos acima
desta vida, porque lá é que os efeitos se fazem sentir. Ora, tudo quanto se
chama infelicidade, consoante a vossa estreita visão, cessa com a vida e
encontra compensação na existência futura.
Vou
revelar-vos a infelicidade sob novo aspecto, através de uma bela e agradável
forma, que acolhereis e desejareis com todas as veras d vossa alma ludibriada.
A infelicidade está na alegria, no prazer, no rumor, na agitação leviana, na
louca satisfação dessa vaidade que sufoca a consciência, oprime a atividade do
pensamento e atordoa o homem com relação a seu futuro. A infelicidade é o ópio
do esquecimento, que atraís com todas as energias.
Esperai
vós que chorais! Tremei vós outros que rides, porque já satisfizestes o corpo!
Não se pode iludir a Deus, nem se escapa do destino, e as vossas provações,
credoras mais impiedosas que a malta açulada pela miséria, espreitam a vossa
ilusória tranquilidade para vos lançar subitamente na agonia da verdadeira infelicidade,
surpreendendo-vos a alma afrouxada pela indiferença e pelo egoísmo.
Oxalá
que o espiritismo vo esclareça e reponha no seu legítimo foco a verdade e o
erro, tão estranhamente desfigurados pela vossa cegueira! Então agireis como
bravos soldados, que, longe de fugir ao perigo, preferem as lutas dos combates
arriscados, à paz que lhes não pode conferir nem glórias, nem progresso. Que
importa ao soldado perder na escaramuça as armas, as mochilas, o fardamento, desde
que dali saia vencedor e glorioso? Que importa a quem tem fé no futuro deixar
no campo de batalha da vida a fortuna e o indumento de carne, de vez que a sua
alma entre radiosa no reino celeste?
Fonte: O Evangelho Segundo o
Espiritismo - Allan Kardec - 3a. Edição - Editora Petit - São Paulo,
SP - 2000.
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