LIVRO SEGUNDO.
CAPÍTULO. III.
RETORNO DO ESPÍRITO DA VIDA CORPÓREA À VIDA ESPIRITUAL.
PERTURBAÇÃO ESPÍRITA.
Questão.
Nº. 165.
O conhecimento do
Espiritismo exerce alguma influência sobre a duração, mais ou menos longa, da
perturbação?
“Influência muito grande, por isso que o Espírito já antecipadamente
compreendia a sua situação. Mas, a prática do bem e a consciência pura são o que
maior influência exercem.”
Por ocasião da morte, tudo, a princípio, é confuso.
De algum tempo precisa a alma para entrar no conhecimento de si mesma.
Ela se acha como que aturdida, no estado de uma pessoa que despertou de
profundo sono e procura orientar-se sobre a sua situação. A lucidez das idéias
e a memória do passado lhe voltam à medida que se apaga a influência da matéria
que ela acaba de abandonar, e à medida que se dissipa a espécie de névoa que
lhe obscurece os pensamentos.
Muito variável é o tempo que dura a perturbação que se segue à morte.
Pode ser de algumas horas, como também de muitos meses e até de muitos anos.
Aqueles que, desde quando ainda viviam na Terra, se identificaram com o estado
futuro que os aguardava, são os em quem menos longa ela é, porque esses compreendem
imediatamente a posição em que se encontram.
Aquela perturbação apresenta circunstâncias especiais, de acordo com os
caracteres dos indivíduos e, principalmente, com o gênero de morte. Nos casos
de morte violenta, por suicídio, suplício, acidente, apoplexia, ferimentos,
etc., o Espírito fica surpreendido, espantado e não acredita estar morto.
Obstinadamente sustenta que não o está. No entanto, vê o seu próprio corpo, reconhece
que esse corpo é seu, mas não compreende que se ache separado dele. Acerca-se
das pessoas a quem estima, fala-lhes e não percebe por que elas não o ouvem.
Semelhante ilusão se prolonga até ao completo desprendimento do perispírito. Só
então o Espírito se reconhece como tal e compreende que não pertence mais ao
número dos vivos. Este fenômeno se explica facilmente.
Surpreendido de improviso pela morte, o Espírito fica atordoado com a
brusca mudança que nele se operou; considera ainda a morte como sinônimo de
destruição, de aniquilamento.
Ora, porque pensa, vê, ouve, tem a sensação de não estar morto.
Mais lhe aumenta a ilusão o fato de se ver com um corpo semelhante, na
forma, ao precedente, mas cuja natureza etérea ainda não teve tempo de estudar.
Julga-o sólido e compacto como o primeiro e, quando se lhe chama a atenção para
esse ponto, admira- se de não poder palpá-lo. Esse fenômeno é análogo ao que ocorre
com alguns sonâmbulos inexperientes, que não crêem dormir.
É que têm o sono por sinônimo de suspensão das faculdades.
Ora, como pensam livremente e vêem, julgam naturalmente que não dormem.
Certos Espíritos revelam essa particularidade, se bem que a morte não lhes
tenha sobrevindo inopinadamente.
Todavia, sempre mais generalizada se apresenta entre os que, embora
doentes, não pensavam em morrer. Observa-se então o singular espetáculo de um
Espírito assistir ao seu próprio enterramento como se fora o de um estranho,
falando desse ato como de coisa que lhe não diz respeito, até ao momento em que
compreende a verdade.
A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de
bem, que se conserva calmo, semelhante em tudo a quem acompanha as fases de um
tranqüilo despertar. Para aquele cuja consciência ainda não está pura, a
perturbação é cheia de ansiedade e de angústias, que aumentam à proporção que
ele da sua situação se compenetra.
Nos casos de morte coletiva, tem sido observado que todos os que perecem
ao mesmo tempo nem sempre tornam a ver-se logo.
Presas da perturbação que se segue à morte, cada um vai para seu lado,
ou só se preocupa com os que lhe interessam.
Fonte: “O LIVRO DOS ESPÍRITOS” - Allan Kardec - 54a.
Edição - Editora LAKE - São Paulo, SP - 1994.
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