Era uma vez Cármen Cinira, Um
coração
Cheio de sonho e flor, que
mal se abrira
Nos jardins encantados da
ilusão...
Estraçalhou-se para sempre
Na voragem
Das trevas, dos abrolhos!...
Era uma vez Cármen Cinira...
Uma suposta imagem
Da perene alegria,
Mas que trouxe em seus olhos,
Eternamente,
Essa amarga expressão de alma
doente,
Cheia de pranto e de
melancolia!...
Cármen Cinira! Cármen Cinira!
Que é da minha cigarra
cantadeira?
Embalde te procuro.
Por que cantaste assim a vida
inteira,
Cigarra distraída do futuro?
Perturbada,
Aturdida,
Busco a mim mesma aqui
nestoutra vida...
Onde estou, onde estou?
Minha vida terrena se acabou
E sinto outra existência
revelada!
Não sei por que me sinto
amargurada...
Sinto que a luz me guia
Para a paz, para um mundo de
alegria.
Mas, ó imortalidade
Se na Terra eu te via
Como a aurora divina da
verdade,
Não julguei que inda a morte
me abriria
Esse cenário deslumbrante
De outros sóis e de outros
seres,
E vejo agora
Que não amei bastante,
E não cumpri à risca os meus
deveres!
A fagulha de crença
Que eu possuía,
Devia transformar numa
fornalha imensa
De fé consoladora,
E incendiar-me para ser
luzeiro.
Mas, ó Senhor da paz
confortadora,
Eu vi chegar o dia derradeiro
Em minha dor, na máscara de
festa,
E a morte me apanhou
Como se apanha uma ave na
floresta.
Experimento a grande
liberdade!
Todavia, Senhor, ampara-me e
protege
Minha triste humildade!
Eu te agradeço a paz que já
me deste,
Mas eis que ainda te imploro
comovida,
Porque me sinto em fraca
segurança;
Deixa que eu guarde ainda
nesta vida
Meu escrínio de estrelas da
Esperança.
CÁRMEN
CINIRA.
Nome literário de Cinira do Carmo
Bordini Cardoso: nasceu no Rio de Janeiro, em 1902, e faleceu em 30 de agosto
de 1933. Sua espontaneidade poética era tão grande que ela própria acreditava
serem os seus versos de origem mediúnica. Glorificou o Amor, a Renúncia, o
Sacrifício e a Humildade, em obras como: Crisálida, Grinalda de Violetas,
Sensibilidade.
Fonte: PARNASO DE ALÉM - TÚMULO -
CÁRMEN CINIRA - Chico Xavier- Editora FEB. Rio de Janeiro RJ - 1935.
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