O LIVRO
DOS ESPÍRITOS.
LIVRO SEGUNDO.
CAPÍTULO. XI.
OS TRÊS REINOS.
Questão. Nº. 613. Embora de todo errônea, a idéia
ligada à metempsicose
não
terá resultado do sentimento intuitivo que o
homem
possui de suas diferentes existências?
“Nessa, como em muitas outras crenças, se
depara esse sentimento intuitivo. O homem, porém, o desnaturou, como costuma
fazer com a maioria de suas idéias intuitivas.”
Seria verdadeira a metempsicose, se
indicasse a progressão da alma, passando de um estado inferior a outro
superior, onde adquirisse desenvolvimentos que lhe transformassem a natureza.
É, porém, falsa no sentido de
transmigração direta da alma do animal para o homem e reciprocamente, o que
implicaria a idéia de uma retrogradação, ou de fusão. Ora, o fato de não poder
semelhante fusão operar-se, entre os seres corporais das duas espécies, mostra
que estas são de graus inassimiláveis, devendo dar-se o mesmo com relação aos
Espíritos que as animam. Se um mesmo Espírito as pudesse animar
alternativamente, haveria, como conseqüência, uma identidade de natureza,
traduzindo-se pela possibilidade da reprodução material.
A reencarnação, como os Espíritos a
ensinam, se funda, ao contrário, na marcha ascendente da Natureza e na
progressão do homem, dentro da sua própria espécie, o que em nada lhe diminui a
dignidade. O que o rebaixa é o mau uso que ele faz das faculdades que Deus lhe
outorgou para que progrida. Seja como for, a ancianidade e a universalidade da
doutrina da metempsicose e, bem assim, a circunstância de a terem professado
homens eminentes provam que o princípio da reencarnação se radica na própria
Natureza. Antes, pois, constituem argumentos a seu favor, que contrários a esse
princípio.
O ponto inicial do Espírito é uma dessas
questões que se prendem à origem das coisas e de que Deus guarda o segredo.
Dado não é ao homem conhecê-las de modo
absoluto, nada mais lhe sendo possível a tal respeito do que fazer suposições,
criar sistemas mais ou menos prováveis. Os próprios Espíritos longe estão de
tudo saberem e, acerca do que não sabem, também podem ter opiniões pessoais
mais ou menos sensatas.
É assim, por exemplo, que nem todos pensam
da mesma forma quanto às relações existentes entre o homem e os animais.
Segundo uns, o Espírito não chega ao
período humano senão depois de se haver elaborado e individualizado nos
diversos graus dos seres inferiores da Criação. Segundo outros, o Espírito do homem
teria pertencido sempre à raça humana, sem passar pela fieira animal. O
primeiro desses sistemas apresenta a vantagem de assinar um alvo ao futuro dos
animais, que formariam então os primeiros elos da cadeia dos seres pensantes. O
segundo é mais conforme à dignidade do homem e pode resumir-se da maneira
seguinte:
As diferentes espécies de animais não
procedem intelectualmente umas
das outras, mediante progressão. Assim, o espírito da ostra não se torna
sucessivamente o do peixe, do pássaro, do quadrúpede e do quadrúmano. Cada
espécie constitui, física e moralmente, um tipo absoluto, cada um de
cujos indivíduos haure na fonte universal a quantidade do princípio inteligente
que lhe seja necessário, de acordo com a perfeição de seus órgãos e com o
trabalho que tenha de executar nos fenômenos da Natureza, quantidade que ele,
por sua morte, restitui ao reservatório donde a tirou. Os dos mundos mais
adiantados que o nosso (ver nº 188) constituem igualmente raças distintas,
apropriadas às necessidades desses mundos e ao grau de adiantamento dos homens,
cujos auxiliares eles são, mas de modo nenhum procedem das da Terra,
espiritualmente falando. Outro tanto não se dá com o homem. Do ponto de vista
físico, este forma evidentemente um elo da cadeia dos seres vivos; porém, do
ponto de vista moral, há, entre o animal e o homem, solução de continuidade. O
homem possui, como propriedade sua, a alma ou Espírito, centelha divina que lhe
confere o senso moral e um alcance intelectual de que carecem os animais e que
é nele o ser principal, que preexiste e sobrevive ao corpo, conservando sua
individualidade. Qual a origem do Espírito? Onde o seu ponto inicial? Forma-se
do princípio inteligente individualizado? Tudo isso são mistérios que fora
inútil querer devassar e sobre os quais, como dissemos, nada mais se pode fazer
do que construir sistemas. O que é constante, o que ressalta do raciocínio e da
experiência é a sobrevivência do Espírito, a conservação de sua individualidade
após a morte, a progressividade de suas faculdades, seu estado feliz ou
desgraçado de acordo com o seu adiantamento na senda do bem e todas as verdades
morais decorrentes deste princípio.
Quanto às relações misteriosas que existem
entre o homem e os animais, isso, repetimos, está nos segredos de Deus, como muitas
outras coisas, cujo conhecimento atual nada importa ao nosso progresso e
sobre as quais seria inútil determo-nos.
Fonte: “O LIVRO DOS ESPÍRITOS” - Allan Kardec - 54a.
Edição - Editora LAKE - São Paulo, SP - 1994.
Nenhum comentário:
Postar um comentário